Artigo
Cem Millôr
Por Paulo Rosa - Caps Porto, Ambulatório Saúde Mental, Telemedicina PM Pelotas, Hospital Espírita
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Estamos sobrevoando os cem anos de nascimento do Millôr. Há muito a celebrar. Nada nem ninguém é mais brasileiro do que Millôr. Não houve assunto que o gajo não tocasse, revirasse, invertesse, deslocasse, avessasse e te fizesse pensar, e rir, de forma nova sobre tudo que já era tido e dado como pão comido. Arrancar o novo de dentro do velho, nisso foi mestre. Em tudo tinha interesse e a ninguém – nem a si – poupava. Iconoclasta mor.
Que melhor crítico e autocrítico e tradutor (Shakespeare) e cronista político e profundíssimo dramaturgo e humorista (sentido filosófico) e poeta e cartunista e gozador universal? Sem nunca ter posto um pé dentro de universidade. Claro, ele se dizia formado numa suposta “Universidade do Meier”, o subúrbio carioca mais improvável para quaisquer das elucubrações metafísicas que lhe eram habituais. Era o jeito escrachado que encontrava para descolocar os cultores do ultra-erudito: muito engraçado foi quando disse, naqueles idos, que “FhC era um superlativo de PhD”. Síntese suprema.
E quão bem entendia e identificava com a maior precisão os chatos? “Chato é um sujeito que conta tudo tim-tim por tim-tim e depois entra em detalhes.” “Chato é o sujeito que tem um uísque numa mão e nossa lapela na outra.” “Chato é um sujeito que não admite saco vazio.” “É melhor um patife do que um chato, porque ninguém consegue ser patife 24 horas por dia.” “Chato é o sujeito que, assim que é apresentado, começa a fazer o comercial de si mesmo.” “Chato é uma pessoa que não sabe que ‘como vai?’ é um cumprimento, não uma pergunta.” “O verdadeiro chato, / Chato mesmo _ sem par, / É o que vive chateado / Sem ninguém o chatear!” “Quando um chato vai embora, que presença de espírito!” “Só um chato teima em ser interessante mais de meia hora.” “Não só temos que aceitar que todo homem médio é chato como temos que aceitar que todos somos médios.” “Às vezes eu só não saio de uma festa muito chata com receio de que ela melhore.” Se bem percebi o que quis dizer o mestre nesse quesito, é que podemos ficar descansados, já nos tocará o momento chatice, por moto próprio ou por beneplácito de outrem.
E a lenha nos políticos? “Por mais hábil que seja, o político acaba sempre cometendo alguma sinceridade.” “Quando um político grita que outro é um tremendo ladrão público, é impossível não revelar na voz um leve traço de inveja.” “O político é um gaiato / Que prefere a versão ao fato.” “Mais cedo ou mais tarde todo político corresponde aos que não confiam nele.” “Político mineiro é franco e direto – vai logo dando pseudônimo aos bois.” “Político profissional jamais tem medo do escuro. Tem medo é da claridade.” “Eu não entendo nada de política. Mas percebo todas as politicagens.” “Política é a mais antiga das profissões.”
Vai para Carlos Eduardo Behrensdorf que, sherlockianamente, desde o Planalto, usa seu periscópio e nos informa o dia a dia, neste popular diário de Pelotas.
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